quarta-feira, 30 de novembro de 2022

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O frio nunca me apeteceu. Estar perto e precisar de um esforço de combustão para sentir o calor, não se aquecer apenas pelo toque e o contato, é como se algo estivesse em falta, como se as lufadas de vento da rotina e do habito apagassem a chama natural, que só volta a arder quando o frio treme as entranhas, num esforço plástico de buscar um equilíbrio que dura um átimo, um estalo de faíscas e logo se apaga sem ser devidamente alimentado, retornando à frieza anterior.


A chama irrefreada também não me apetece. Não que o calor não seja o ideal, afinal a labareda dançante é como o abraço que deliciosamente queima a pele, acordando os sentidos e tornando o contato uma própria reprodução de uma língua de fogo pulsante... Mas que não se mantém, a menos que seja constantemente alimentado. E a chama não compartilha o oxigênio, ela apenas o consome! O fogo não permite a companhia, pois seu ardor é sobre atrair tudo para si e alimentar-se, aumentando sua chama e consumindo tudo que se aproxima. E se não for devidamente alimentado, se apaga. Não é possível estar ao lado, só longe, em contemplação, ou dentro, à serventia de combustível.


O morno, tampouco, me apetece. E a esta altura devo soar como um insatisfeito a quem nada agrada. Afinal se à frieza falta calor e à chama falta partilha, o ideal não seria o meio termo, o equilíbrio entre os dois extremos? Não, eu digo, pois o morno é a temperatura dos temerários. Opta pelo morno a pessoa que tem medo de se queimar, portanto não experimenta a chama, mas também a pessoa que foge da frieza, pois o tremor será sempre solitário. O morno não aquece nem esfria. O morno é vazio. E o vazio é ainda pior que os anteriores, pois promete esquentar na solidão, sem oferecer o calor da companhia. Ora, de que adianta?


Mas então o que sobra? Se os extremos transbordam e o meio esvazia, o que buscar? Aliás, por que buscar? Ora, sei eu o que arde em mim? Preciso me encaixar nesses termos?

Eu prefiro, então, queimar como brasa. Arder constantemente, exalar calor, manter aquecido, ao tempo que minhas chamas não consumirão meus arredores. A brasa não apenas permite, sem absorver, a companhia de outras, mas também as tem como bem vindas! Afinal, o calor provocado pela parceria a mantém acesa, sem suprimir o calor da outra. Assim como ela não se apaga instantaneamente ao sentir o vento frio, também não é de pronto absorvida pela presença do fogo, pois ao ser lambida pelas chamas, ela também se alimenta, se aproximando de uma perenidade deliciosa, que mantém o ardor e atiça os sentidos sem queimar rapidamente, prolongando a sensação de aconchego, calor e conforto... e que enquanto arder, viva!